Sabe aquelas situações em que a pessoa se sente meio
perdida em um ambiente, um ‘peixe fora d’água’? Era assim que estavam se
sentido duas professoras de Ji-Paraná na 1ª Conferência DIR/Flootime
Internacional no Brasil, realizada na última semana de outubro, em Itaperuna,
Rio de Janeiro/RJ. Estavam, porque a mesma coisa que as fez sentir deslocadas
acabou se transformando no diferencial das educadoras rondonienses no evento
internacional: elas eram as únicas representantes de uma entidade pública a
trabalhar com autismo entre várias clínicas particulares, de diversos estados,
que atendem crianças portadoras do distúrbio.
A observação é da professora Márcia Pereira Souza,
diretora do Centro Municipal de Atendimento Educacional Especializado para
Autismo de Ji-Paraná – CMAEE Autismo. Acompanhada da professora Dalva Rosa da Silva,
Márcia esteve frente a frente com duas estadunidenses verdadeiras sumidades em se tratando de autismo, uma, nada menos que a criadora do
método/modelo DIR/Floortime, a fonoaudióloga Serena Wieder e outra, a terapeuta
educacional Rosemary White, da Profectum Foundation, entidade referência sobre
autismo nos Estados Unidos.
O modelo
D.I.R./Floortime
O modelo D.I.R./Floortime foi desenvolvido nos
Estados Unidos e resulta de anos de observações e estudos a respeito do
desenvolvimento infantil desde os anos 50. O modelo se baseia no
desenvolvimento funcional da criança, suas diferenças individuais e
relacionamentos, objetivando a formação das bases para as competências sociais,
emocionais e intelectuais dos autistas. O método, de acordo com Márcia,
representa uma revolução no atendimento de autistas e promoveu um salto qualitativo
no trabalho com as crianças no Centro de Autismo de Ji-Paraná.
Resumidamente, o “D” significa Desenvolvimento
Funcional Emocional, o “I” Diferenças Individuais e o “R” Relacionamentos. Já o
Floortime é uma das estratégias do DIR, que significa literalmente “tempo no
chão”, onde o terapeuta ou professor segue os interesses emocionais da criança
ao tempo em que a desafia a ir em direção ao maior domínio das capacidades
sociais, emocionais e intelectuais.
A
Conferência
Toda as despesas das professoras Márcia e Dalva para participarem da Conferência Internacional foram custeadas pela Administração Municipal. Elas levaram à Conferência dois casos de
crianças atendidas no Centro que foram analisadas por Serena. Pedro Augusto, de 4 anos, tem dificuldade na
flexibilização para aceitar mudanças e o Carlos Henrique, de 7 anos, não
adquiriu linguagem ainda depois de dois anos de acompanhamento.
As professoras ji-paranaenses receberam sugestões do
que fazer nos dois casos e aproveitaram para tiras dúvidas que surgiram no
decorrer do trabalho no Centro de Autismo.
“Percebemos, com a pessoa mais entendida no modelo
do mundo, que o que estamos fazendo estamos fazendo bem, e o que erramos,
erramos muito pouco”, disse entusiasmada a diretora do Centro de Autismo.
Mudanças
importantes
Sobre os “erros” comentados por Márcia, estes não
dependem unicamente dela ou da equipe do Centro para serem solucionados, mas de
toda uma cadeia de ações que precisam ser discutidas e se possível
implementadas. Um dos problemas apontados pelas especialistas é a fragmentação
dos atendimentos às crianças autistas. Segundo elas, o apoio do psicólogo, do
fonoaudiólogo e do fisioterapeuta precisa ser feito na própria instituição.
Hoje, a oferta destas especialidades é feita, quando feita, em vários locais e
por profissionais distintos, que não conhecem a rotina das crianças. Também, no
caso do psicólogo, ele precisa prestar atendimento não só à criança, mas à
família dela, para identificar as mudanças que ocorrem.
Márcia falou que uma das coisas que foram muito
discutidas é intervenção precoce, para crianças de creches a partir dos 9 meses
de idade, uma vez que quanto mais cedo a criança for diagnosticada, melhor a
resposta à terapia.
O que tem preocupado mesmo a diretora do Centro de
Autismo de Ji-Paraná é o número de famílias que têm procurado atendimento.
Até da
Capital
“Uma mãe, moradora de Porto Velho, procurou o Centro
e lhe informamos que só poderíamos atender crianças de Ji-Paraná. Desesperada,
a mãe alugou uma casa aqui na mesma semana e veio embora deixando tudo pra
trás. Hoje o Ian é o nosso 26º aluno. Não temos como, não podemos negar
atendimento a pessoas nessa situação. Sabemos do sofrimento que é ter uma
criança com autismo sem um acompanhamento especializado. Abrimos as portas com
9 crianças e já estamos com 26 e uma fila de espera de mais 5 crianças. Nosso
espaço já está pequeno de novo”, relatou Márcia.
Outro problema, bem mais fácil de resolver e que já
está sendo conversado, é a volta das mães às salas de atendimento das crianças.
Elas precisam estar presentes em pelo menos 2 das 3 horas das sessões.
Resultados
Além de poder aprofundar os conhecimentos sobre o
método nas áreas de linguagem, motor e sensorial, a participação na Conferência
Internacional resultou na aprovação do acesso às duas professoras para o curso
de terapeutas, que tem duração de 2 a 3 anos.
“Agora não sei se poderemos pagar para fazer o
curso, que seria um sonho para nós como profissionais”, explicou Márcia,
aproveitando o ensejo para divulgar a venda das famosas pizzas da APP do
Centro, nos dias 26 e 27 deste mês, que servirá para ajudar a custear parte da viagem
de todas as professoras do Centro de Autismo à Recife, Pernambuco, para uma experiência
de capacitação na forma de internato no Centro de Desenvolvimento Infantil –
CDI Recife, um centro de referência no atendimento a crianças autistas no
Brasil.